Ações contra construtoras: Os 5 mitos do direito imobiliário

Atualmente, as ações contra construtoras estão crescendo mais de 400% em algumas regiões do Brasil, segundo dados recentes dos tribunais estaduais. No entanto, mesmo com esse aumento exponencial, advogados e estudantes de direito ainda enfrentam desafios significativos para compreender os verdadeiros limites e possibilidades dessas demandas.
Isso acontece porque, na verdade, o direito imobiliário brasileiro está repleto de mitos que, quando não esclarecidos, podem comprometer completamente a estratégia processual. Nesse contexto, conhecer os direitos reais dos clientes e as interpretações jurisprudenciais atualizadas faz, sem dúvida, toda a diferença entre ganhar ou perder uma causa milionária.
Pensando nisso, neste artigo, você vai descobrir os cinco principais mitos sobre ações contra construtoras que, muitas vezes, podem estar sabotando seus casos. Adicionalmente, vamos apresentar dados estatísticos relevantes, jurisprudência consolidada e estratégias práticas para maximizar suas chances de êxito processual.
Mito 1 das ações contra as construtoras: “O prazo de garantia é sempre de apenas 5 anos”

Este é, sem dúvida, o mito mais perigoso no contencioso imobiliário brasileiro. Muitos profissionais acreditam erroneamente que, após cinco anos da entrega do imóvel, a responsabilidade da construtora simplesmente desaparece. No entanto, a realidade jurídica é muito mais complexa e favorável aos consumidores.
O artigo 618 do Código Civil estabelece que o empreiteiro responde “durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho”. Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que este é um prazo de garantia, não de prescrição.
Na prática, isso significa que os cinco anos são apenas o período em que a culpa da construtora é presumida. Ou seja, durante esse tempo, o comprador não precisa provar que o defeito foi causado por falha construtiva. Por outro lado, após esse período, ainda é possível processar a construtora, desde que o autor prove a culpa.
Vícios ocultos e a vida útil dos sistemas construtivos
Além disso, quando falamos de vícios ocultos, a situação muda completamente. As normas técnicas da ABNT, especialmente a NBR 15575-1, estabelecem prazos de vida útil para diferentes sistemas construtivos. Dessa forma, enquanto esses sistemas estiverem dentro do prazo de vida útil previsto tecnicamente, a responsabilidade pode persistir.
Consequentemente, estruturas de concreto armado têm vida útil mínima de 50 anos. Portanto, defeitos estruturais identificados até esse período podem gerar responsabilização, desde que comprovada a origem construtiva e a manutenção adequada pelo condomínio.
| Sistema Construtivo | Vida Útil Mínima | Prazo Garantia NBR 17.170 | Responsabilidade Civil |
| Estrutura | 50+ anos | 5 anos | Até fim vida útil* |
| Impermeabilização | 20 anos | 5 anos | 20 anos* |
| Sistemas Hidráulicos | 20 anos | 3 anos | 20 anos* |
| Revestimentos Fachada | 13 anos | 3 anos | 13 anos* |
| Esquadrias | 13 anos | 1 ano | 13 anos* |
*Desde que comprovada origem construtiva e manutenção adequada
Sempre solicite ao cliente o Manual do Proprietário e verifique se houve manutenções preventivas registradas. A falta de manutenção adequada pode isentar a construtora de responsabilidade, mesmo dentro dos prazos legais.
Mito 2 das ações contra as construtoras: “Cláusula de tolerância de 180 dias é sempre válida”

Tradicionalmente, construtoras incluem cláusulas contratuais que permitem atraso de até 180 dias na entrega do imóvel sem qualquer penalidade. Entretanto, nos últimos anos, essa prática vem sendo cada vez mais questionada e derrubada pelos tribunais brasileiros.
Nesse sentido, o Tribunal de Justiça de São Paulo, em decisão paradigmática de 2014, estabeleceu que a cláusula de tolerância só pode ser aplicada somente em casos de força maior. Isso significa que problemas previsíveis como falta de mão-de-obra, aumento de custos ou dificuldades de financiamento não justificam, de forma alguma, a aplicação da carência.
Ademais, é fundamental entender que essa interpretação se baseia no princípio da boa-fé objetiva e no artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor, o qual, por sua vez, considera abusivas as cláusulas que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.
Consequências práticas para suas ações contra as construtoras
Isso significa que, mesmo quando o contrato prevê os 180 dias, você pode argumentar pela invalidade desta cláusula. Consequentemente, a indenização ao cliente pode começar a ser calculada desde o primeiro dia de atraso após o prazo original.
Muitas construtoras tentam incluir cláusulas que ampliam ainda mais esse prazo, chegando a 240 ou até 360 dias. Essas disposições são claramente abusivas e devem ser contestadas imediatamente na petição inicial.
Cálculo da indenização por atraso
A jurisprudência consolidada estabelece que a indenização padrão é de 0,5% a 1% do valor atualizado do imóvel por mês de atraso. Além disso, o comprador pode cumular:
- Danos materiais: Aluguel que deixou de receber ou que precisou pagar durante o atraso
- Danos morais: Frustração da expectativa, especialmente quando há casamento, nascimento de filho ou mudança de cidade
- Multa contratual: Quando prevista no contrato (aplicação do princípio da isonomia contratual)
- Devolução de valores indevidos: Como correção pelo INCC durante o período de atraso
Mito 3 das ações contra as construtoras: “Só é possível processar a construtora que vendeu o imóvel”

Muitos advogados limitam suas ações exclusivamente contra a construtora vendedora do imóvel. Contudo, a cadeia de responsabilidade no direito imobiliário é muito mais ampla e oferece diversas possibilidades estratégicas.
Responsabilidade solidária no mercado imobiliário
Inicialmente, é fundamental compreender que há responsabilidade solidária entre diversos agentes do empreendimento. Dessa forma, você pode direcionar sua ação contra:
- Incorporadora – Responsável pelo projeto e comercialização
- Construtora – Executora da obra
- Projetistas – Arquitetos e engenheiros responsáveis pelos projetos
- Agente financeiro – Quando há participação direta na viabilização do empreendimento
- Fornecedores de materiais – Em casos específicos de vícios em componentes
Patrimônio de Afetação: proteção ou armadilha?
Um ponto crucial que muitos advogados desconhecem: o Patrimônio de Afetação (Lei 10.931/2004) separa juridicamente cada empreendimento, criando um CNPJ exclusivo. Portanto, quando a construtora opta por esse regime, cada obra responde apenas com seus próprios recursos.
Contudo, isso não significa impossibilidade de execução. Na verdade, você pode:
- Desconsiderar a personalidade jurídica quando houver desvio de finalidade
- Incluir os sócios no polo passivo em casos de fraude
- Acionar outras empresas do grupo econômico
| Réu Potencial | Responsabilidade | Quando Incluir | Vantagens |
| Incorporadora | Solidária integral | Sempre | Maior patrimônio |
| Construtora | Solidária integral | Sempre | Responsável direto |
| Sócios/Administradores | Subsidiária | Fraude/Desvio | Garantia execução |
| Projetistas | Específica | Erro de projeto | Seguro profissional |
| Instituição Financeira | Objetiva (CDC) | Vício + financiamento | Patrimônio robusto |
Segundo dados da CBIC, mais de 150 mil processos envolvendo o programa Minha Casa Minha Vida tramitam atualmente. A Caixa Econômica Federal já pagou mais de R$250 milhões em indenizações, demonstrando que incluir a instituição financeira no polo passivo pode ser estratégico.
Mito 4 das ações contra as construtoras: “Vícios aparentes e ocultos têm o mesmo prazo”

A confusão entre vícios aparentes e ocultos é responsável por milhares de processos prescritos ou decaídos anualmente. Portanto, compreender essas diferenças é absolutamente essencial para qualquer advogado que atue no contencioso imobiliário.
Vícios aparentes: prazo decadencial de 90 dias
Vícios aparentes são aqueles facilmente identificáveis na vistoria de entrega do imóvel. Por exemplo: paredes tortas, azulejos quebrados, portas desalinhadas, tomadas mal instaladas. Nesses casos, aplica-se o artigo 26, inciso II do CDC, que estabelece prazo decadencial de 90 dias.
Importante destacar: esse prazo começa a contar da entrega efetiva do imóvel. Além disso, a jurisprudência vem entendendo que divergências contratuais claras (como metragem inferior à prometida ou ausência de itens do memorial descritivo) também se enquadram como vícios aparentes.
Vícios ocultos: quando o prazo inicia?
Por outro lado, vícios ocultos são aqueles não identificáveis na entrega, manifestando-se apenas posteriormente. Exemplos clássicos: infiltrações, problemas estruturais, defeitos em fundações. Nesses casos, o prazo de 90 dias (decadencial) ou 5 anos (prescricional) só começa quando o vício se torna evidente.
Consequentemente, mesmo que o imóvel tenha sido entregue há anos, se o vício só se manifestou recentemente, os prazos estão preservados. Essa distinção é crucial para fundamentar adequadamente suas petições.
Tabela prática: prazos por tipo de pretensão
| Pretensão | Natureza | Prazo | Base Legal | Início Contagem |
| Obrigação de fazer (reparo) | Decadencial | 90 dias | CDC art. 26, II | Ciência do vício |
| Abatimento/Rescisão | Decadencial | 90 dias | CDC art. 26, II | Ciência do vício |
| Indenização por vício | Prescricional | 10 anos | CC art. 205 | Ciência do vício |
| Indenização estrutural | Prescricional | 10 anos | CC art. 618 + 205 | Aparecimento defeito |
Ações ajuizadas com base na correta classificação do vício têm taxa de êxito 73% superior às que confundem as categorias jurídicas, segundo levantamento do CNJ sobre processos de 2020-2024.
Estratégias para identificação correta
Primeiramente, sempre realize uma vistoria técnica com engenheiro civil antes de classificar o vício. Ademais, fotografe e documente extensivamente todas as evidências. Finalmente, solicite ao cliente histórico completo de quando os problemas começaram a aparecer.
Mito 5 das ações contra as construtoras: “Toda ação contra construtora precisa de perícia complexa e cara”

Muitos advogados evitam ações contra construtoras por acreditarem que toda demanda exige perícia técnica complexa e extremamente onerosa. Entretanto, essa percepção está longe da realidade processual.
Quando a perícia é realmente necessária
A perícia técnica é, de fato, indispensável em certas situações, principalmente em casos de vícios estruturais que comprometem a solidez do imóvel. Além disso, ela é crucial quando a origem do defeito precisa ser tecnicamente determinada, bem como na necessidade de quantificação precisa dos danos ou em disputas sobre responsabilidade entre múltiplos agentes.
Por outro lado, diversas situações felizmente dispensam uma perícia complexa, exigindo apenas uma prova documental simples. Por exemplo, o atraso de obra prova-se com o contrato e o habite-se. Da mesma forma, uma área menor que a contratada exige apenas uma medição simples. Finalmente, a ausência de itens do memorial descritivo pode ser demonstrada por vistoria fotográfica, assim como a cobrança de taxas abusivas é verificada por mera análise documental.
Alternativas à perícia tradicional
Além disso, é fundamental notar que existem alternativas mais acessíveis e igualmente eficazes. Por exemplo, laudos técnicos extrajudiciais elaborados por engenheiros contratados diretamente pelo cliente podem ser, na prática, suficientes em muitos casos.
Ademais, e este é um ponto-chave, a própria Lei 13.105/2015 (CPC) permite que o juiz decida com base em outros elementos probatórios, especialmente quando a perícia for excessivamente onerosa ou desnecessária. Portanto, construir um bom conjunto probatório documental e testemunhal pode ser, sem dúvida, uma estratégia vencedora.
Checklist: estruturando provas sem perícia judicial
| Prioridade | Ação | Prazo | Dificuldade |
| Alta | Notificação extrajudicial documentada | Imediato | ⭐ |
| Alta | Fotografias/vídeos datados dos vícios | Antes da ação | ⭐⭐ |
| Alta | Laudo técnico particular | 15-30 dias | ⭐⭐ |
| Média | Coleta testemunhas (vizinhos, síndico) | Antes da ação | ⭐⭐ |
| Média | Histórico manutenções/reclamações | 10-15 dias | ⭐⭐⭐ |
| Baixa | Orçamentos de reparo | 7-10 dias | ⭐ |
É importante notar que, recentemente, os tribunais vêm aceitando provas técnicas simplificadas, sobretudo em casos onde a construtora dificulta o acesso para perícia ou, ainda, quando o vício é evidentemente claro.
Essa postura, aliás, se baseia no princípio da aptidão para produção de prova, o qual, na prática, favorece o consumidor, justamente por ser considerado a parte vulnerável tecnicamente na relação.
Resolução CJF 956/2025: o que mudou nas ações massificadas

Recentemente, em 2025, o Conselho da Justiça Federal editou a Resolução 956, criada especificamente para tratar de ações massificadas envolvendo vícios construtivos, sobretudo no programa Minha Casa Minha Vida. Sem dúvida, essa norma representa mudança significativa na condução desses processos.
A principal inovação, por exemplo, é a padronização dos quesitos periciais. Afinal, anteriormente, cada processo tinha quesitos diferentes, o que dificultava comparações e gerava laudos inconsistentes. Agora, no entanto, há modelos obrigatórios que, como resultado, facilitam a análise técnica e aceleram a tramitação.
Além disso, outro ponto fundamental é que a Resolução determina capacitação técnica específica para peritos que atuam nessa área. Na prática, isso significa laudos mais qualificados e, consequentemente, decisões mais justas.
Recomendação CJF nº 3/2025: aspectos estruturantes
Vale destacar que a Recomendação CJF nº 3/2025, que atua como complementar à Resolução, busca alinhar entendimentos sem engessar magistrados. Em síntese, ela estabelece que juízes devem considerar aspectos estruturantes da política habitacional, evitando, assim, que a judicialização excessiva comprometa o direito à moradia.
Portanto, ao elaborar petições iniciais contra construtoras do MCMV, é imprescindível ir além do caso individual. Primeiramente, o advogado deve considerar o impacto da decisão na política pública habitacional. Além disso, é vital ponderar a proporcionalidade entre o direito individual pleiteado e o direito coletivo.
Da mesma forma, torna-se crucial explorar soluções intermediárias antes de se pedir a rescisão, bem como realizar uma análise de custo-benefício sobre a continuidade do empreendimento.
Essa cautela é necessária porque há um descompasso evidente: para 1,4 milhão de unidades entregues, existem apenas 14 mil queixas administrativas contra 150 mil processos judiciais. Consequentemente, esse cenário pode gerar novas teses defensivas das construtoras. Sendo assim, antecipe-se!
Estratégias avançadas para maximizar resultados nas ações contra construtoras
Agora que já desmistificamos os cinco principais mitos, vamos explorar estratégias avançadas que, de fato, diferenciam advogados comuns dos verdadeiros especialistas em contencioso imobiliário.
Nesse contexto, primeiramente, sempre faça uma análise econômica completa antes de propor a ação. Ou seja, avalie cuidadosamente se a pretensão vale financeiramente o custo processual. Ademais, considere também as possibilidades de acordo extrajudicial com desconto razoável em comparação ao desgaste natural de um longo processo.
Uso inteligente de tutelas de urgência
No contexto jurídico atual, as tutelas de urgência mostram-se extremamente eficazes em ações imobiliárias. Para ilustrar essa utilidade prática, podemos citar o bloqueio de vendas de unidades, uma medida essencial especialmente quando há risco iminente de insolvência da empresa. Além disso, em casos de vícios graves no imóvel, torna-se viável o pedido de depósito judicial das parcelas vincendas.
Do mesmo modo, essa ferramenta jurídica permite a suspensão de negativações indevidas, prevenindo danos ao consumidor quando a construtora ameaça com inadimplência injusta. Por fim, destaca-se também a possibilidade de realização antecipada de perícia, garantindo, assim, a preservação de provas fundamentais antes que se percam com o tempo.
Formação de litisconsórcio ativo

Quando vários compradores do mesmo empreendimento enfrentam problemas similares, formar litisconsórcio ativo gera diversas vantagens. Dessa forma, você dilui custos, fortalece argumentos e aumenta pressão sobre a construtora para acordo global.
Mediação e câmaras de arbitragem especializadas
Embora o contencioso seja necessário muitas vezes, é inegável que a mediação e a arbitragem especializadas em direito imobiliário oferecem soluções mais rápidas. Sendo assim, sugira essas alternativas quando apropriado, demonstrando, dessa forma, modernidade e foco em resultados.
Outro ponto relevante é que construtoras de grande porte têm políticas internas de acordo, justamente para evitar jurisprudência desfavorável. Por isso, processos bem fundamentados e com provas robustas costumam, na prática, gerar propostas de conciliação antes da sentença.
Conclusões sobre as ações contra construtoras
Ao longo deste artigo, desmistificamos cinco crenças que, muitas vezes, comprometem diariamente a atuação de advogados em ações contra construtoras. Nesse sentido, vimos que os prazos de responsabilidade vão muito além dos cinco anos comumente citados, que cláusulas de tolerância podem ser consideradas abusivas e, ainda, que a cadeia de responsabilidade oferece múltiplas possibilidades estratégicas.
Ademais, esclarecemos as diferenças fundamentais entre vícios aparentes e ocultos, bem como demonstramos que nem toda ação exige perícia complexa, além de apresentarmos as mudanças trazidas pela Resolução CJF 956/2025. Sem dúvida, esses conhecimentos são ferramentas poderosas para construir teses jurídicas vencedoras.
Por fim, lembre-se: o contencioso imobiliário brasileiro está em constante evolução. Afinal, manter-se atualizado sobre jurisprudência, legislação e estratégias processuais faz, de fato, toda a diferença entre resultados medianos e excepcionais para seus clientes.

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